O Turismo na era da Inteligência Artificial

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Decius Valmorbida, presidente da Unidade de Viagens da Amadeus

Decius Valmorbida, presidente da Unidade de Viagens da Amadeus

Nos anos 1990, o mundo se preparava, entre o descrédito e o medo, para o início de uma era digital, para a transformação que a internet traria para nossas vidas – e nem estávamos vislumbrando a telefonia móvel, a realidade virtual, a inteligência artificial. No Turismo, era a década dos CRS (sistemas de reserva computadorizados), que chegaram ao Brasil e mudaram a forma de fazer buscas e reservas aéreas. Eles viraram GDS (sistemas globais de distribuição), cortaram os cordões umbilicais com seus fundadores (as empresas aéreas) e foram além das reservas de avião, investindo em tecnologia para todo o setor e em mais variedade de reservas – de hotéis, carros, produtos e serviços diversos que apareceram pelo caminho, como os meios de pagamento e a gestão de dados (BI).

A Amadeus é um dos grandes players globais de tecnologia para o Turismo, com uma visão de futuro bastante abrangente e rica. A IA define um novo salto tecnológico em nossas vidas, quase 30 anos depois, e no lugar do medo temos o deslumbramento. Podemos tudo. Mas também temos a incógnita. O que vai mudar e em que velocidade? Como o Turismo se beneficia desse momento? Quem está ameaçado ou desafiado?

Um dos grandes nomes desse segmento, e presidente da unidade global de Viagens da Amadeus, é o brasileiro Decius Valmorbida, que conversou com a gente na última Phocuswright Conference, em Phoenix, Arizona, em uma entrevista completada posteriormente por e-mail, e que publicamos agora na íntegra, para a edição especial da WTM Latin America, onde a Amadeus patrocina, com a PANROTAS, o Melhores do Turismo 2025.

Decius Valmorbida iniciou sua carreira na Amadeus como diretor de Operações da Amadeus Commercial Organization (ACO) brasileira e foi diretor geral da ACO South LATAM e, logo depois, diretor América Latina. Atualmente é o presidente da Unidade de Viagens da Amadeus, desde agosto de 2020 e membro do comitê executivo da Amadeus desde 2017. Anteriormente, Valmorbida era o chefe global da Unidade de Distribuição de Viagens

PANROTAS – Vamos começar com o que todo mundo quer saber. O que você prevê como a grande revolução no uso da inteligência artificial em viagens?

DECIUS VALMORBIDA – A Amadeus está investindo em novas ferramentas para aproveitar o poder da IA generativa, com equipes em toda a empresa trabalhando para explorar suas possibilidades. Na fase de planejamento de viagens, a tecnologia pode criar experiências de pesquisa e compra inspiradoras e centradas no viajante, pesquisando, resumindo e apresentando informações de maneiras novas e acessíveis. Com a IA generativa, o objetivo de uma viagem, as expectativas e a disposição de pagar podem ser identificados por meio de conversas com o chatbot. O conteúdo será adaptado ao que o viajante está procurando e as interrupções nos planos de viagem poderão ser resolvidas mais rapidamente por meio de sistemas inteligentes de remarcação.

E depois da viagem, a IA generativa pode ajudar a avaliar o feedback do cliente e permitir que as empresas de viagens respondam aos comentários on-line, melhorem sua reputação e mantenham contato com os clientes, entre outras coisas. Uma solução popular entre as agências de viagens é o Amadeus Hey! Digital Travel Companion, que fideliza o cliente oferecendo informações e serviços personalizados antes, durante e depois da viagem. Combinamos conhecimento, dados e conteúdo com IA generativa para criar adoção e engajamento por meio de uma interface de usuário conversacional.

Pixabay/Gerd Altmann

IA generativa pode ajudar a avaliar o feedback do cliente e permitir que as empresas de viagens respondam aos comentários on-line

IA generativa pode ajudar a avaliar o feedback do cliente e permitir que as empresas de viagens respondam aos comentários on-line

PANROTAS – A experiência no aeroporto passará por uma grande mudança devido a essa nova tecnologia? Biometria, realidade virtual, rastreamento de passageiros em dispositivos móveis, check-ins e segurança mais eficientes. Onde essa revolução será mais visível e no que a Amadeus está apostando e investindo?

VALMORBIDA – Nos próximos anos, os viajantes da América Latina podem esperar uma experiência aprimorada nos aeroportos, graças a um aumento significativo no investimento tecnológico por parte das companhias aéreas e dos aeroportos. De acordo com o estudo Travel Technology Investment Trends 2024 da Amadeus, os aeroportos da região planejam aumentar seu investimento em tecnologia em uma média de 17,3% nos próximos 12 meses, com foco na migração para a nuvem, melhorando a experiência do passageiro e o desempenho operacional. Para atingir esses objetivos, os aeroportos latino-americanos implementarão tecnologias como análise de dados, biometria no check-in, entrega e embarque de bagagens e melhor compartilhamento de dados com as companhias aéreas parceiras.

A TECNOLOGIA BIOMÉTRICA, QUE PERMITE QUE OS PASSAGEIROS PASSEM FACILMENTE PELOS PONTOS DE SERVIÇO SEM A NECESSIDADE DE DOCUMENTOS IMPRESSOS, É UMA PRIORIDADE. CERCA DE METADE DOS AEROPORTOS JÁ EXPERIMENTOU A BIOMETRIA E OUTROS 40% PLANEJAM IMPLEMENTÁ-LA EM BREVE.

Decius Valmorbida

As companhias aéreas também estão alinhadas com essa abordagem, aumentando seus orçamentos de tecnologia em uma média de 14%. Seus principais objetivos incluem melhorar a experiência do passageiro no aeroporto, modernizar a aceitação de pagamentos e usar ferramentas de Inteligência Artificial para planejar melhor suas redes e horários de voos. A demanda por viagens aéreas voltou em toda a América Latina, e o setor está focado em atender a essa demanda com inovações que tornam a experiência de viagem mais confortável e sem estresse.

Em termos de investimento, no ano passado adquirimos a Vision-Box, o que permitiu à Amadeus aumentar rapidamente o papel da tecnologia biométrica na experiência aeroportuária. Por meio dessa oferta combinada com a Vision-Box, a Amadeus agora oferece uma experiência completa e perfeita para o passageiro, desde a reserva até a chegada ao aeroporto, passando pelo embarque e pelo controle de fronteira.

PANROTAS – Quais são os gargalos da distribuição aérea atualmente? O NDC é o que se esperava e é realmente o futuro? Qual é o papel dos GDSs nesse cenário?

VALMORBIDA – O principal gargalo é a fragmentação do conteúdo, o que torna a vida dos agentes de viagens muito mais complexa. Em muitos mercados, os agentes de viagens estão maximizando seu acesso ao conteúdo usando aplicativos que integram ofertas dos GDSs e outras fontes. Além disso, para várias companhias aéreas, seus processos de vendas e serviços devem ou podem ser gerenciados diretamente em seus sites.

O GDS continua sendo o canal preferido para obter conteúdo aéreo para a maioria dos agentes de viagens e, na Amadeus, queremos ajudar nossos vendedores de viagens a superar esse desafio de fragmentação.

Decius Valmorbida

É por isso que estamos trabalhando continuamente para desenvolver nossa Amadeus Travel Platform para que se torne uma plataforma de vendas inigualável, reunindo conteúdo de todo o ecossistema de viagens, independentemente do tipo, da fonte e da tecnologia utilizada. Isso significa também explorar parcerias que nos permitirão colaborar de forma diferente com nossos clientes e parceiros para obter e integrar conteúdo novo e relevante que talvez não tenhamos hoje.

Quando se trata de NDC, a tecnologia tem a capacidade de revolucionar a venda de produtos relacionados a voos, permitindo que as companhias aéreas criem ofertas personalizadas com base em preferências, contexto e dados em tempo real. Essa tecnologia apresenta novas oportunidades para melhorar o varejo, como permitir que as companhias aéreas criem ofertas personalizadas de acordo com a identidade do viajante ou da empresa.

A transição para o NDC será gradual e coexistirá com o EDIFACT por algum tempo, portanto, é fundamental que as soluções de viagem gerenciem as duas tecnologias sem interrupção. Na Amadeus, as agências de viagens e os clientes corporativos podem comparar o conteúdo, independentemente da tecnologia utilizada, em uma única tela e se beneficiar da integração total.

Freepik

Na Amadeus, as agências de viagens e os clientes corporativos podem comparar o conteúdo, independentemente da tecnologia utilizada, em uma única tela e se beneficiar da integração total

Na Amadeus, as agências de viagens e os clientes corporativos podem comparar o conteúdo, independentemente da tecnologia utilizada, em uma única tela e se beneficiar da integração total

A Amadeus, como a maior plataforma de distribuição de viagens e fornecedora de soluções tecnológicas para companhias aéreas, está em uma posição única para impulsionar o NDC. Temos o compromisso de maximizar seu potencial para todas as partes interessadas, evoluindo o antigo e adotando o novo. Aproveitamos todos os avanços que essa nova tecnologia traz, mas também nos certificamos de que ela faça sentido para aqueles que a utilizam, sem comprometer a eficiência operacional.

A adoção generalizada do NDC também enfrenta um desafio: não se trata realmente de um padrão. Há uma adoção inconsistente e diferentes interpretações do padrão pelas companhias aéreas, resultando em um cenário complexo que retarda e aumenta o custo da implementação do NDC. O objetivo da Amadeus é proporcionar uma experiência de implementação tranquila para os agentes de viagens em várias companhias aéreas, normalizando dados e fluxos, garantindo eficiência operacional e melhores experiências para os viajantes.

Recentemente, a Amadeus e a Latam Airlines e suas afiliadas anunciaram um acordo de distribuição plurianual que melhorará significativamente a experiência de viagem dos clientes nas américas e em outros países. De acordo com esse acordo renovado e ampliado, o conteúdo de origem NDC da Latam Airlines e o conteúdo de origem tradicional (edifact) estarão disponíveis por meio da Amadeus Travel Platform para todos os agentes de viagens da Amadeus, proporcionando aos vendedores de viagens mais flexibilidade e opções de viagem personalizadas.

Decius Valmorbida

Além disso, anunciamos uma colaboração renovada com a Viva, a companhia aérea de custo ultrabaixo do México. Essa parceria ampliada agora incluirá o acesso às ofertas de origem NDC da companhia aérea e uma gama completa de ofertas de merchandising por meio da tecnologia EDIFACT, enriquecendo e expandindo significativamente o conteúdo para os agentes de viagens da América Latina.

Vejo o NDC como a chave para o futuro da distribuição aérea e do varejo de viagens moderno. Ela permitirá que os viajantes tenham uma experiência mais próxima do comércio eletrônico on-line, como a Amazon. Essa experiência será muito mais personalizada e contextualizada, com ofertas adaptadas ao seu perfil específico. Para as companhias aéreas, isso significará maior controle sobre as ofertas feitas, permitindo que elas criem mais relevância nas ofertas e se diferenciem.

No entanto, o NDC não é uma solução do tipo “plug and play”, requer investimento em tempo, dinheiro e recursos para todas as partes interessadas – companhias aéreas, agências de viagens, agregadores e GDSs. Mas, trabalhando juntos, podemos progredir, desenvolver e liberar todo o seu potencial e proporcionar melhores experiências de viagem para os passageiros

PANROTAS – Há alguma mudança prevista no aspecto omnichannel do setor? Veremos mais ou menos canais de vendas?

VALMORBIDA – As soluções da Amadeus são projetadas para permitir uma abordagem integrada das interações com os clientes em vários pontos de contato, seja um site, aplicativos móveis, chatbots, call centers, mídias sociais ou um agente presencial. Nosso objetivo sempre foi proporcionar uma experiência consistente e personalizada, permitindo que os viajantes reservem, modifiquem ou gerenciem suas viagens sem esforço, da maneira que desejarem. Não prevejo que isso mude em um futuro próximo; precisamos encontrar os viajantes onde eles querem comprar viagens.

PANROTAS – O que os consumidores estão buscando em 2025 que as companhias aéreas e o setor de Turismo em geral precisam prestar mais atenção?

VALMORBIDA – As expectativas dos viajantes mudaram quando se trata de procurar ou comprar uma viagem. Hoje, os varejistas on-line podem oferecer ambientes de compras sofisticados, projetados para atender a uma série de necessidades de forma rápida e eficiente, enquanto os processos de pagamento foram simplificados para permitir o check-out com um único clique.

Os varejistas de roupas on-line permitem que os compradores examinem de perto, ou até mesmo experimentem virtualmente, os produtos antes de fazer uma compra, enquanto os provedores de conteúdo digital, como a Netflix, oferecem recomendações personalizadas para atender às expectativas dos espectadores.

A contextualização é cada vez mais importante. Os consumidores se acostumaram com ofertas baseadas em históricos de compras e de navegação, bem como em listas de desejos. O entendimento de sua localização significa que as opções de moeda, idioma e frete são consideradas de forma dinâmica/automática durante uma transação. Lembretes sobre carrinhos abandonados ou itens reabastecidos são comuns, enquanto ofertas sensíveis ao tempo baseadas na atividade do cliente são utilizadas.

Em resumo, as expectativas aumentaram. As experiências de compras digitais aprimoradas agora são a norma, e uma transparência mais profunda, interfaces fáceis de usar, opções de autoatendimento e um atendimento ao cliente eficiente e imediato tornaram-se a ordem do dia. As viagens devem responder a essas expectativas em evolução, seja no mercado de viagens a lazer, a negócios ou mistas.

Decius Valmorbida

PANROTAS – Como você vê o setor de aviação no Brasil e na América Latina?

VALMORBIDA – O setor de aviação no Brasil e na América Latina tem um grande potencial de crescimento, impulsionado por uma classe média em ascensão e um mercado de viagens com demandas a serem atendidas. Estamos entusiasmados com a adoção da nossa tecnologia pelo setor de aviação da região e, na Amadeus, abraçamos a natureza dinâmica desse mercado, reconhecendo-a como uma oportunidade de resiliência e adaptabilidade.

No entanto, a região também enfrenta desafios, como altos impostos sobre o consumo, limitações de infraestrutura, descarbonização e instabilidade geopolítica. Apesar desses obstáculos, o setor de aviação no Brasil e na América Latina apresentou crescimento (com aumento de 5,4% na capacidade das companhias aéreas na América Latina em abril de 2025), e com as companhias aéreas implementando com sucesso reestruturações financeiras para apoiar essa expansão.

Também estamos observando um forte crescimento doméstico na capacidade (crescimento de 5% em 2024), que é um ativo importante para garantir a estabilidade e o crescimento futuros. A natureza dinâmica dessa região apresenta uma oportunidade única de resiliência e adaptabilidade, e temos o compromisso de apoiar a ambição dessa região por meio de tecnologia inovadora e parcerias estratégicas.

A PANROTAS viajou a convite da Phocuswright, BWH Hotels e Delta Air Lines, com proteção GTA

Esta matéria faz parte da edição especial da Revista PANROTAS, de número 1.597, distribuída na WTM LATIN AMERICA 2025. Confira a publicação digital abaixo.


Com informações de Artur Luiz Andrade

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